Publicado em: 20 de novembro de 2018 13h11min / Atualizado em: 21 de novembro de 2018 07h11min
O dia 20 de novembro é reconhecido no Brasil como o dia da Consciência Negra em referência ao dia de morte do líder negro Zumbi dos Palmares. Em muitas cidades do Brasil, essa data é considerada feriado municipal. Para o movimento social negro, marca um importante momento de luta, no qual é possível ampliar as discussões em torno da igualdade racial e problematizar a estrutura racista que caracteriza a sociedade brasileira e rejeitar a versão da história, que apresenta os brancos, na figura da Princesa Isabel, como aqueles que libertaram e que libertam os negros. Homens e mulheres negras sempre lutaram por liberdade. Para nós, para o NEABI-UFFS-CH, engajados na luta e resistência pela igualdade racial, todo dia é dia de consciência negra. Trabalhamos todos os dias por isso!
No entanto, cabe utilizar a visibilidade gerada por essa data para chamar atenção para alguns aspectos. Não obstante o quadro de desigualdades entre brancos, negros e indígenas, não é raro um contra movimento que aciona, em novembro - quando esse tema ganha mais destaque - o discurso da consciência humana em contraposição à luta pela Consciência Negra.
Por que celebrar a Consciência Negra? Embora seja verdade que raças, no sentido biológico, não existam, pois fazemos, todos, parte da espécie humana, não podemos deixar de considerar que, nas sociedades multirraciais ou plurirraciais, como a sociedade brasileira, o grupo branco e o grupo não-branco (negros, indígenas) têm ocupado diferentes lugares em consideração à forma como esses pertencimentos são significados nas nossas relações sociais. Ser branco, negro e indígena são identidades construídas no marco do domínio colonial, caracterizado pela escravização e o extermínio de povos em favorecimento do grupo branco, e implicam em diferentes acessos aos bens materiais e simbólicos.
Infelizmente estamos bastante distantes de um padrão de igualdade entre esses dois grupos. Se todos nós tivéssemos condições de olhar a sociedade com um olhar distanciado, como um estranho que acabou de aterrissar nessas terras, seria fácil admitir que, enquanto coletividade, temos reservado aos brancos os melhores lugares. Enquanto os trabalhos mais pesados, insalubres, desgastantes fisicamente são reservados, prioritariamente, à população negra. Também é a população negra que é mais perseguida e morta pela polícia, assim como, frequentemente, são os membros desse grupo os primeiros a serem postos sob suspeição por seguranças de estabelecimentos comerciais. Não raro, as crianças negras têm experiências bastantes negativas com o ambiente escolar, que não valoriza e não inclui a história do seu grupo, a cultura e a história africana como parte dos saberes escolares. O que faz da escola um lugar no qual negros e indígenas encontram-se excluídos como referência de saberes e conhecimento.
Celebrar a Consciência Negra tem como objetivo romper com o pacto de silêncio sobre os privilégios que o grupo branco ocupa na sociedade brasileira. Se por um lado isso implica em problematizar a desigualdade racial, por outro exige o reconhecimento da cultura negra e indígena, das religiões de matriz africana, da História da África e da História Indígena como elementos constitutivos da identidade brasileira, assim como são as influências europeias. É apostar em um projeto de sociedade, na qual os negros e os indígenas, assim como os brancos, possam estar em toda parte, sem que haja lugares pré-definidos em razão desses pertencimentos étnico-raciais. É, enfim, projetar um mundo em que ser um homem ou uma mulher negra, ser um homem ou uma mulher indígena não tenha qualquer outro significado que não seja o de ser humano.
Claudete Gomes Soares
Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas Afrobrasileiros e Indígenas (Neabi)
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