Publicado em: 05 de outubro de 2020 09h10min / Atualizado em: 05 de outubro de 2020 15h10min
Um momento que trouxe bastante orgulho para o curso de Letras Português e Espanhol da UFFS: uma aluna defendeu seu TCC totalmente escrito em língua espanhola. “Como professora de Espanhol envolvida nas lutas nacionais pela valorização de seu ensino nas escolas e, sobretudo, na valorização dos docentes e discentes que escolheram essa língua como base profissional, sinto-me profundamente orgulhosa. É um marco importante para o curso de graduação em Letras Português e Espanhol - Licenciatura, pois é um dos primeiros trabalhos a ser apresentado e escrito totalmente em espanhol”, destaca a orientadora do TCC, Geni Moura da Costa.
Apaixonada pela língua, a autora e estudante do curso de Letras, Carline Limana, também ressaltou a importância do ensino da língua em sala de aula e contou um pouco da sua trajetória e envolvimento em várias atividades, nas quais pode desenvolver essa habilidade desde o início do curso.
Carline abordou um tema com alta relevância social, devido a sua importância em debater, discutir e trazer à tona: a violência contra a mulher. No centro de sua pesquisa estava o livro “Por qué Volvías Cada Verano” escrito pela jornalista argentina Belén López Peiró, que relatou histórias de abusos sexuais sofridos entre seus 13 e 16 anos. Dessa forma, ela costurou temas como a literatura, a quarta onda feminista e o lugar de fala. Mostrando assim a importância da literatura como expressão de dores e traumas. Conforme afirma Carline, a literatura é uma forma de sentir, de dividir um pouco dos sentires, de libertar -se (quem escreve), ainda que sabendo que haverá julgamentos, e libertar (quem lê). É romper silêncios para, a partir daí, poder contar novas histórias.
Fizeram parte da banca a professora da UFFS – Campus Cerro Largo Sandra Vidal Nogueira e a professora Caroline Mitidieri Selvero.
Acompanhe a entrevista abaixo com a professora Geni e com a aluna Carline, respectivamente, sobre o trabalho.
ASCOM – CL: Este é um tema muito delicado de falar, de abordar. Até porque a abordagem é a partir do lugar de fala de outra pessoa, no caso a autora do livro. Como foi para você orientar esse trabalho, levando em consideração a relevância do tema?
Professora Geni da Costa (doravante G.C.): Como professora de Literaturas de Língua Espanhola, foi envolvente orientar uma aluna tão comprometida com a língua e com os temas sobre a mulher. Primeiro, porque, como muitas outras questões culturais e sociais discutidas ao longo da história, um tema só deixa de ser delicado ou difícil de ser abordado quando amplamente discutido. E a literatura é propícia para projetar experiências e alavancar transformações quando estamos dispostos a escutar as vozes que procuram romper limites sociais. Segundo, porque, mesmo não se colocando no lugar da autora, o TCC da Carline pretende ser exatamente esse espaço de reflexão crítica sobre um tema que faz parte do universo feminino e que ela tem vivenciado como mulher. Isso porque, quando falamos em lugar de fala, como nos esclarece Djamila Ribeiro em seu livro “O que é lugar de fala?” (2017), estamos nos referindo a lugar como posição dentro de uma estrutura social e não só de vivências, de experiências. E “fala” transcende o dito, é a própria existência.
ASCOM – CL: E como foi para você orientar com relação a apresentação em outra língua? O que isso representa para o curso, para você como professora e também para um estudante da Língua Espanhola?
G.C.: O espanhol é uma das línguas mais faladas no mundo, tornando o curso de Língua Espanhola especialmente importante para uma região de fronteira. As universidades e seus professores precisam acompanhar as mudanças mundiais e buscarem a pluralidade linguística, fundamentais na inclusão social. Em mais de 10 anos de UFFS, este trabalho de conclusão de curso é um dos primeiros escrito em língua espanhola. Como professora de Espanhol envolvida nas lutas nacionais pela valorização de seu ensino nas escolas e sobretudo na valorização dos docentes e discentes que escolheram esta língua como base profissional, sinto-me profundamente orgulhosa. É um incentivo para outros estudantes de Espanhol empenharem-se em seu desenvolvimento na língua que escolheram para sua formação. E gratificante para a aluna – apesar de todas as dificuldades e barreiras que se impuseram pela escolha da língua, desde a elaboração até e busca de avaliadores – ver seu trabalho concluído. Saber que existe espaço e apoio para que abracem suas próprias escolhas (língua e tema) será sempre um estímulo às alunas e alunos.
Entrevista com Carline Limana
ASCOM – CL: Qual foi a motivação pessoal para falar sobre esse assunto no seu TCC?
Aluna Carline Limana (doravante CL): O que me motivou a escrever sobre esse tema foi acreditar. Eu sempre acreditei na luta feminista, sempre vi as mulheres à minha volta (e inclusive eu) sendo silenciadas e colocadas em padrões. Também muito me motivou começar a ler mais sobre feminismo (e a entender essa luta de ideias) a violência contra a mulher, que foi uma problemática muito presente, de modo indireto, na minha infância e é, ainda, muito presente. Eu, como aluna do curso de Letras, em um ambiente em que tenho acesso a informações e perspectivas múltiplas (não que esse seja o único meio), sinto essa necessidade de usar essa voz que tenho para falar sobre o assunto, para falar sobre a literatura na quarta onda feminista e tocar nessas pautas que o movimento feminista traz e que devem ser discutidas, visibilizadas, assim, ajudando a possibilitar a construção de novos (e múltiplos) enredos para a história que nós, mulheres, estamos contando. Com a nossa voz. Com as nossas vozes.
ASCOM – CL: Um dos pontos tratados no TCC é a quarta onda feminista. No que consiste essa onda?
CL: A quarta onda feminista tem como ponto de partida - para algumas teóricas, posto que não se tem um início definido, dado o seu recente estabelecimento - essa explosão da Internet. Nela, há o uso das redes sociais, das hashtags como modo de organização e de protesto nessa luta. Também, são levantadas outras pautas, como a gordofobia (e outras questões que envolvem o corpo, já debatidas na terceira onda), a violência contra a mulher, o feminicídio, o feminismo entendido em sua pluralidade e a troca de "igualdade" por "equidade", além de outras questões que surgem e estão configurando essa onda. Inclusive, esse foi um dos motivos de trazer essa escrita: o fato de haver pouca teoria sobre, assim que se pensou neste trabalho como uma motivação para continuações.
ASCOM – CL: De que forma você vê a literatura nesta imbricação entre a arte e a expressão de dores e traumas emocionais?
CL : A literatura representa, para mim, muita coisa. Representa fazer parte de algo e, dentre muito, representa uma janela que se abre para um mundo que eu posso explorar. Isso está acontecendo com a literatura hispânica, e foi explorando esse mundo que eu me deparei com muitas das obras feministas que eu li, algumas em português, outras em espanhol. Entre essas obras estava a de Belén López Peiró e ela representa tanto, que eu nem consigo colocar em palavras. A autora traz dores, culpas, medos, processos que nos são familiares, mas que não poderemos nunca dizer que entendemos. Mas sentimos um pouco, devido à literatura. Ela nos possibilita entender o que acontece, porque infelizmente a vítima precisa expor a sua história e fazê-lo reiteradas vezes e, mesmo assim, não há justiça. A literatura, neste trabalho e na minha caminhada com ela, levando em conta essa questão das dores e traumas, é uma forma de sentir, de dividir um pouco dos sentires, de libertar -se (quem escreve), ainda que sabendo que haverá julgamentos, e libertar (quem lê). É romper silêncios para, a partir daí, poder contar novas histórias
ASCOM – CL: Como foi (é) para você apresentar seu TCC totalmente em espanhol?
CL : Para mim, é uma grande realização poder apresentar o trabalho em espanhol, posto que eu me identifico, desde as primeiras aulas, com essa língua e sua cultura. Acredito na importância do espanhol e entendo, como acadêmica de um curso que é de dupla licenciatura (Português e Espanhol), a importância de valorizar a área de Língua Espanhola durante a formação, pois só assim conseguiremos ensinar aos nossos alunos a importância dessa língua. Retomo que, desde o início, a língua espanhola me despertou interesse e eu sempre procurei participar de atividades nessa área, porque era, ou melhor, é algo que me enche de felicidade e traz sentido para a minha caminhada. Eu acredito na importância da língua espanhola, acredito na importância da literatura hispânica e na força dos feminismos latinoamericanos. Sou muito grata às minhas professoras, professores e colegas por fazerem parte desse caminho, seja pelas discussões, pelas partilhas ou pelo simples fato de caminhar juntos. Apresentar esse trabalho, com essa temática e em língua espanhola, é a concretização de tudo o que eu acredito e de tudo o que me motiva como mulher e como docente em formação.
O TCC foi apresentando no dia 30 de setembro, on-line.
Aos que tiverem interesse em ler o trabalho "La Literatura Hispanoamericana en la Cuarta Ola Feminista: Rompiendo Silencios, Contando Nuevas Historias", podem solicitar pelo e-mail: carlinelimana@gmail.com.
Em breve, o trabalho estará no repositório digital da UFFS.
ÚLTIMAS NOTÍCIAS
25 de novembro de 2024
Eventos
25 de novembro de 2024
Ingresso
22 de novembro de 2024
Informe UFFS
22 de novembro de 2024
Nossa UFFS