Publicado em: 20 de dezembro de 2017 13h12min / Atualizado em: 20 de dezembro de 2017 15h12min
Vamos aos dados: de 1955 a 2017, 93,3% dos prefeitos do município de Cerro Largo foram de descendência alemã, contra 6,7% de prefeitos com sobrenome “brasileiro”, ou seja, das 15 gestões, apenas 1 não era de descendência explicitamente alemã. Dos vice-prefeitos, 86,7% eram de descendência alemã. De vereadores, nesse mesmo período, 71,1% foram descendentes de alemães, 16,2% de “brasileiros” e 12,7% de descendentes de italianos. Com relação às empresas do município, das 20 maiores, 18 são controladas por descendentes de alemães.
O censo do IBGE aponta ainda que em Cerro Largo existem setores, cuja população é composta por mais de 40% de negros. É o caso do setor censitário nº 11, que corresponde ao sul do Bairro Brasília e parte da Vila Nova. Esta localidade apresenta as piores condições de saneamento básico de toda a zona urbana do município. Trata-se do único setor onde os moradores estão expostos ao esgoto a céu aberto. Também é ali onde mais de 40% das suas vias não estão pavimentadas, e não há calçamento em 98% da localidade. Ainda segundo o IBGE, é neste setor onde os moradores recebem o menor rendimento de todo município. Em contraste, a área central e adjacências do município é onde há a maior concentração de pessoas brancas, 100% das vias são pavimentadas e onde está a maior concentração de renda mensal.
“Será coincidência? ”, pergunta-se o mestrando em Desenvolvimento e Políticas Públicas da UFFS – Campus Cerro Largo, Leandro Alexandre da Silva. Esse questionamento levou-o a desenvolver, com a orientadora Sandra Vidal Nogueira, a dissertação intitulada “Paisagens silenciosas: a invisibilidade do Negro em Cerro Largo” na qual, por meio desses e outros dados, constatou a existência de uma situação de invisibilidade da população negra cerro-larguense. Sobre esse assunto paira um total silêncio. “A falta de representatividade política e econômica desses cidadãos; a inexistência de políticas, projetos e ações voltadas a melhorar suas condições básicas de acesso à renda, consumo e qualidade de vida; a invisibilidade verificada nos registros da história oficial do município; e a ausência de debates sobre desigualdades étnico-raciais se configuram no que chamamos de silêncio da ausência”, explica o pesquisador. Segundo Leandro “os negros em Cerro Largo vivem em um não-lugar de invisibilidade, silêncio e negação de seus direitos, o que termina por relegá-los a uma situação de quase-cidadania. Tal situação é uma clara violação aos direitos humanos e aos preceitos democráticos de nosso país, por isso, urge a construção de políticas públicas no sentido de incluir essa população na cidadania”.
Leandro é historiador, natural de São Paulo, e mora em Cerro Largo desde 2010. Em seu trabalho, o estudante, que já teve esse olhar de visitante, diz que quem chega no município, abre o jornal, frequenta os restaurantes, comércio e prefeitura pode chegar a uma conclusão: “Cerro Largo é mesmo uma cidade de alemão. Porém, o censo do IBGE confirma que essa é uma análise superficial”. Em Cerro Largo, a população negra, na zona urbana, chega a 20%, segundo o censo do IBGE (2010). Para Leandro, 20% de indivíduos declarados pretos e pardos é uma porcentagem expressiva para o município. E por que eles não circulam nesses espaços?
Invisibilidade e silêncio
Segundo o autor, para explicar a forma como a sociedade historicamente se organizou, ele usa a metáfora da cebola, que ilustra uma divisão em camadas. “No centro estão os membros da comunidade que se fez hegemônica. Nas camadas mais externas estão os demais descendentes de europeus, como italianos e poloneses. Ainda mais para fora estão os denominados brasileiros”. Durante seu trabalho, Leandro utilizou os termos alemão e brasileiro, se apropriando da forma como usualmente esses termos são empregados. Alemão é o teuto-brasileiro que incorporou os valores atribuídos aos colonizadores pioneiros e se identifica etnicamente como alemão. Brasileiro é a maneira como tradicionalmente os descendentes de portugueses, geralmente mestiços com afro-brasileiros e indígenas são tratados. O autor afirma que “Ser brasileiro em Cerro Largo é ser de fora, é ser o forasteiro étnico”. No modelo da sociedade cebola, que exclui até mesmo o brasileiro, negros e indígenas se encontram totalmente excluídos e silenciados”, conclui Leandro.
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